sexta-feira, 1 de agosto de 2008

OS JOGOS DA MINHA VIDA

[Postado por A.Tapadinhas]


Águia Vitória Tinta da china sobre papel Canson 24x24cm

Escrevi para o jornal uma crónica que quero partilhar convosco. É sobre as simpatias clubistas, em que eu assumo que sou benfiquista. Ser benfiquista em Portugal é declarar-se contra o Sporting. Versão portuguesa da rivalidade entre Palmeiras e São Paulo...

OS JOGOS DA MINHA VIDA
Venho, por este meio, declarar que sou do Benfica. Mas não estou só: toda a minha família, também é. Encontrar um Tapadinhas doutro clube é tão raro, como alguém querer ser comandante dum navio chamado Titanic.
Faço esta declaração porque sei que até ao dia da minha morte, esta afirmação continuará a ser verdadeira, apesar de alguns amigos me pedirem para ser discreto sobre esta minha paixão: - “Como podes pretender que te levem a sério naquilo que escreves, ou na tua pintura, se gostas de futebol?”.
Continuarei a ter a mesma religião, ou seja, nenhuma? A gostar da pintura de Van Gogh e de Nadir Afonso? A odiar as telenovelas? A sonhar com a Michelle Pfeiffer? Votarei no mesmo partido? Continuarei a adorar a minha mulher e as minhas filhas?
A lista das dúvidas é infindável: mudamos de carro, de casa de cidade, de país, qualquer dia de planeta, de amigos, de sexo, mudam-se os tempos e as vontades… mas quero deixar bem claro o seguinte: ninguém muda de clube.
Quando aparece algum candidato a entrar na família, a cor da pele, religião, hábitos alimentares (canibalismo excluído), não têm importância. A primeira pergunta-afirmação é: -“Claro que é do Benfica?!”. Se a resposta for negativa, pode ser (é), um problema: zangas, namoros acabados, divórcios rápidos e impensáveis.
Dois jogos consolidaram, ainda criança, a minha paixão pelo Benfica.
O primeiro foi o da festa de despedida de Francisco Ferreira, contra a forte equipa do Torino, o clube campeão de Itália.
No dia 3 de Maio de 1949 (tinha sete anos), saí de casa com o meu pai, logo de manhã, porque era fundamental chegar cedo ao Estádio do Jamor, para apanhar um bom lugar.
A viagem era demorada por causa dos diversos transportes que éramos obrigados a utilizar: comboio até ao Barreiro, barco até Lisboa, eléctrico até ao Cais do Sodré, comboio eléctrico até Belém, onde se fazia o reforço do farnel com pastéis de nata. No campo não havia ninguém a vender gelados, mas, em compensação, podia-se comprar uns rebuçados, embrulhados em papéis de cores brilhantes que o vendedor não se cansava de apregoar: - “Paladares! Compre cinco, leva seis! Cada cor, seu paladar!”
Eu pedia sempre para trocar os verdes, por dois motivos: faziam lembrar o Sporting e sabiam a mentol, que eu aliava a remédios e poções, enfim, a porcarias.
O lugar que eu gostava, era atrás da baliza do adversário, para ver melhor os golos do Benfica.
Rogério, o “pipi”, grande avançado, que nunca sujava os calções (a versão anos 40 de Néné), depois de trocar os olhos a dois sarrafeiros italianos, desferiu um violento remate por cima da trave que levou a bola, como um bólide, a embater contra a minha pobre cabeça. Caí de costas, a ver bolinhas, num céu vermelho. Julgo que não interromperam o jogo para eu receber assistência.
Einstein sustentou que se dermos a um objecto (a bola) sempre cada vez mais energia (pontapés), o objecto em vez de ir mais depressa, torna-se cada vez mais pesado. Só anos mais tarde compreendi a experiência científica realizada nesse ano de 1949, em que a minha cabeça teve um papel fundamental.
Resultado: fiquei o resto do jogo a julgar que havia dois árbitros em campo, a arbitrar em simultâneo as primeiras e reservas do Benfica contra o Torino. Curiosamente, os dois jogos acabaram com o mesmo resultado: 4 a 3 a favor do Benfica.
Um final feliz para nós mas que ficará ligado para sempre a um acidente terrível: o avião que levava a equipa e dirigentes do Torino, de regresso a casa, despenhou-se, morrendo todos os seus ocupantes.
No dia seguinte, milhares de desportistas encheram a rua em frente da Embaixada de Itália, em Lisboa, numa manifestação de pesar e solidariedade pela tragédia. Nesse dia, senti que não é preciso morrer para conhecer o Inferno.
Vamos para intervalo! Noutro dia, conto o segundo jogo.

18 comentários:

Desabafosescritos disse...

Obrigada António, pela dica. É sempre com muito gosto que leio estes relatos do nosso grandioso. Gostei muito. Fico sempre emocionada. Tem que nos ir contando estas belas histórias...
Um beijo amigo,
Laura

Anne M. Moor disse...

Pintura, escrivinhações, xadrez, futebol,... que maissssssssssssssss!!!!!! Futebol não é meu campinho...
Beijos :-)

Walmir Lima disse...

Aqui no Brasil, quando um sujeito é fanático por um time de futebol dizemos, por exemplo:

"Sou Santista Roxo" (como eu).

Já que és pintor, e mais fanático do que eu, dirias:

"Sou Benfica Arco-Íris"?

De qualquer maneira, sou fanático pelos teus escritos também. Continue!

A.Tapadinhas disse...

À atenção de quem sabe!
Não conseguia entrar no Prozac. Experimentei Anne, Walmir, Flavio... e também não consegui! Assertiva entro sem problemas.
Aparecia mensagem a dizer:
Windows Internet Explorer
X O Internet Explorer não consegue abrir
Operação cancelada.
Quando saía desaparecia a página do blogue e aparecia a mensagem. Fui ao meu guru e ele conseguiu entrar, introduzindo o endereço do blogue e carregando logo a seguir no X (encarnado), em frente do endereço. Foi isso que fiz agora e resultou. O truque é não deixar descarregar todos os elementos do blogue.Não sei se isto está a acontecer com mais alguém. Agora vou almoçar. São servidos? Volto já.
António

A.Tapadinhas disse...

Laura: Temos de nos agarrar à história porque a actualidade não é nada risonha... Vamos ver o que acontece logo à noite.
Beijo.
António

A.Tapadinhas disse...

Anne: Eu acho que todos nós somos assim: Multifacetados! Há anjos e demónios, esperando para se manifestar a qualquer momento...
Beijo demoníaco.
António

A.Tapadinhas disse...

Walmir: Gosteiiiiiiiiiii! Benfica arco-íris! É isso aí! Melhor, muito melhor do que Benfica cor-de-rosa... a camisola de reserva no ano passado!
Abraço.
António

Anne M. Moor disse...

António:
Beijos angelicais... :-)

PS: O blogger estava com o demônio no corpo hoje de manhã... Agora virou anjo... :-)

A.Tapadinhas disse...

Anne: É verdade: Yin Yang, anjo e demónio!
Já entrei no Prozac sem truques. Quem foi o sacerdote que exorcizou os demónios?
Beijo.
António

Walmir Lima disse...

Amigo António,
Não houve exorcismo.
Acontece que o Blogger estava em manutenção.
Eles introduziram algumas 'coisinhas' novas.
Uma delas, fácil de se notar, é que, ao passarmos o 'rato' por algum link surgirá um iconezinho qualquer de crédito ao lado.
Saaai demônio!

Ernesto Dias Jr. disse...

António:
Uma retificação e um pedido:
Qualquer exemplo de rivalidade futebolística tupiniquim tem que incluir o Coríntians. São Paulo e Corintians, Palmeiras e Corintians, Santos e Corintians, Passo Fundo e Coríntians. Qualquer outra combinação é firula.
E o pedido: manda a receita do tal pastel de nata. Parece de dar água na boca...

A.Tapadinhas disse...

Walmir: Sabes, amigo, eu só sei fazer o que vou aprendendo... Quando aparece alguma coisa estranha entro em pânico. Nem o truque que o meu amigo Bill Gates me ensinou que resolve 99% dos casos, funcionava: desligar e voltar a ligar o computador...
Abraço.
António

A.Tapadinhas disse...

Ernesto: Eu li que Corinthians e Palmeiras, é o supra-sumo da rivalidade no Brasil. Foi uma atenção para o São Paulo...
Eu dou uma receita de pastel de nata... mas os pastéis têm de ser comidos na casa que foi fundada em 1837- Pastéis de Belém.
Pasteis de Nata

Ingredientes:
300 g de farinha
250 g de margarina para folhados
Sal e água q.b.
5 dl de natas
9 gemas
9 colheres (sopa) de açúcar

Preparação:
Tempo de preparação: 1.30m
Misture a farinha e o sal diluído na água e trabalhe a massa até a ligar. Divida a margarina em 3 porções. Estenda a massa, espalhe espalhe sobre ela 1 das porções da margarina e enrole como 1 tapete. Repita esta operação mais 2 vezes até se esgotar a margarina. No final, deixe descansar 20 m. Em seguida, corte a massa em fatias com cerca de 2cm de espressura e depois coloque cada fatia sobre 1 forma lisa propria para queques; rode com os dois polegares a forma num sentido, espalhando a massa de modo a encher com ela a forma toda. Entretanto leve ao lume em banho-maria as gemas batidas com o açucar e as natas até o preparado engrossar. Deixe arrefeçer e deite 1 colher de sobremesa de recheio e cada forma. Leve as formas ao forno até os pasteis ficarem cozidos e tostados. Mais ou menos 25 minutos de cozedura.

Observações:
Há quem aprecie come-los com açucar em pó e canela.

Bom apetite!
António

Anne M. Moor disse...

Ernesto,
Há uma maneira mais fácil... Vem a Pelotas... Aqui temos todos os doces portugueses e esses pastéis tbm...

Jorge Lemos disse...

Antonio

Se a bola não o atingisse não haveria um relato tão brilhante.
A dor, as vezes, nos proporciona
oportunidade de contemplar o belo.
Abraços

A.Tapadinhas disse...

Jorge Lemos: Um homem sábio é o que aprende com os próprios erros. Infelizmente, o erro foi de quem chutou a bola...
Abraço amigo.
António

Flavio Ferrari disse...

Caro Tapadinhas. Não entendo muito de futebol. Sou corinthiano mesmo.
Mas creio que se você precisou dar essa explicação tão longa para justificar porque torce para o Benfica, ele não deve ser o líder do campeonato ...

A.Tapadinhas disse...

O campeonato só vai começar no final do mês. Até agora, o Benfica ganhou 31 vezes, o Porto 23 e o Sporting 18. Podemos perder mais sete anos seguidos e continuar na frente...
Abraço.
António